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terça-feira, fevereiro 23



Há noites que são feitas dos meus braços

e um silêncio comum às violetas

e há sete luas que são sete traços

de sete noites que nunca foram feitas
Há noites que levamos à cintura

como um cinto de grandes borboletas.

E um risco a sangue na nossa carne escura

duma espada à bainha de um cometa.

Há noites que nos deixam para trás

enrolados no nosso desencanto

e cisnes brancos que só são iguais

à mais longínqua onda de seu canto.

Há noites que nos levam para onde

o fantasma de nós fica mais perto:

e é sempre a nossa voz que nos responde

e só o nosso nome estava certo.

(Natália Correa)





“deixavam espaços em branco,

em branco,

para as coisas que não sabiam”

(Ezra Pound, Canto 13,

tradução Irmãos Campos

e Décio Pignatari, Ed. Hucitec)



Pensei que era apenas demora,

E cantando pus-me a esperar-te.

Permita que agora emudeça:

Que me conforme em ser sozinha.
 
(Cecilia Meireles)



Ah! que eu não morra sem provar, ao menos

Sequer por um instante, nesta vida

Amor igual ao meu!

(Gonçalves Dias) 

Com uma palavra tão doce,

de maneira tão serena,

que até Deus pensou que fosse

felicidade – e não pena.
 
(Cecilia Meireles)


O amor antigo vive de si mesmo,


Não de cultivo alheio ou de presença...
 
(Carlos Drummond de Andrade)



Certa madrugada fria

irei de cabelos soltos

ver como crescem os lírios...

(Henriqueta Lisboa)



Sonho… que eu e tu, dois pobrezinhos,

Andamos de mãos dadas, nos caminhos

Duma terra de rosas, num jadim,

Num país de ilusão que nunca vi…
 
(Florbela Spanca)
                                               E aos pés um coração de louça...
(Natália Correa)




Sossega, coração! Não desesperes!

Talvez um dia, para além dos dias,

Encontres o que queres porque o queres.

(Fernando Pessoa)




Um pouco de sombra, apenas...

Traze-me um pouco das sombras serenas

que as nuvens transportam por cima do dia!

Um pouco de sombra, apenas,

- vê que nem te peço alegria.

Traze-me um pouco da alvura dos luares

que a noite sustenta no teu coração!

A alvura, apenas, dos ares:

- vê que nem te peço ilusão.

Traze-me um pouco da tua lembrança,

aroma perdido, saudade da flor!

- Vê que nem te digo - esperança!

- Vê que nem sequer sonho - amor!

Cecilia Meireles



Um galo sozinho não tece uma manhã:

ele precisará sempre de outros galos.



De um que apanhe esse grito que ele

e o lance a outro; de um outro galo

que apanhe o grito de um galo antes

e o lance a outro; e de outros galos

que com muitos outros galos se cruzem

os fios de sol de seus gritos de galo,

para que a manhã, desde uma teia tênue,

se vá tecendo, entre todos os galos.



2.

E se encorpando em tela, entre todos,

se erguendo tenda, onde entrem todos,

se entretendendo para todos, no toldo

(a manhã) que plana livre de armação.



A manhã, toldo de um tecido tão aéreo

que, tecido, se eleva por si: luz balão.

João Cabral de Melo Neto

Choras, e eu julgo que nas tuas cordas,

Choram todas as cordas do Passado!

(Augusto dos Anjos)
Enquanto espero

Escrevo uns versos

Depois rasgo

(Adriana Calcanhoto)

Depois rasgo
Mesmo que você fuja de mim

Por labirintos e alçapões

Saiba que os poetas como os cegos

Podem ver na escuridão
(...)
Chico Buarque