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sábado, setembro 4




"Dentro do peito, no entanto; havia ainda aquele ponto brilhante, incandescente, de onde saía uma chuva de pequenas fagulhas. Era quase insuportável. Ela mal tinha coragem de respirar, por medo de atiçar aquele fogo ainda mais; contudo, respirava fundo... fundo. Quase não tinha coragem de olhar-se no espelho frio; mas olhou, e ele mostrou-lhe uma mulher radiante, com lábios trêmulos, sorridentes, grandes olhos escuros e um ar de quem está à espera de que alguma coisa... divina aconteça. Ela sabia que iria acontecer... infalivelmente..."




(Katherine Mansfield)

Maria Rita com Quinteto em Branco e Preto - "Mente ao Meu Coração" - Tra...





Queria mais um amor. Escrevi cartas,

remeti pelo correio a copa de uma árvore,

pardais comendo no pé um mamão maduro

- coisas que não dou a qualquer pessoa -

e mais que tudo, taquicardias,

um jeito de pensar com a boca fechada,

os olhos tramando um gosto.

Em vão.

Meu bem não leu, não escreveu,

não disse essa boca é minha.

Outro dia perguntei a meu coração:

o que há durão, mal de chagas te comeu ?



Não, ele disse: é desprezo de amor.








Tenho me confundido na tentativa de te decifrar,

todos os dias...Minha única certeza é que

de cada vez aumenta ainda mais minha

necessidade de ti..."



Caio Fernando Abreu



Não seja por isso

Eu não tenho pressa

Eu posso esperar vidas inteiras

Mas tenha certeza de que lhe interessa

Deixar escapar o ouro do agora

Para que não seja numa tarde dessas

Tarde demais



Adriana Calcanhoto


"... E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre."


Miguel Sousa Tavares no funeral da mãe, Sophia de Mello Breyner Andresen


«ainda que o digas não partirei -

conheço a nostalgia que vive para sempre no coração da

infância e dos barcos.»




"Pobre moço, não viu a moça.


Não o culpo, a menina tem mesmo esse dom de não se fazer visível, de não ser notada.

O olhar restrito não a deixa mostrar-se, nem ver-se.

Coleciona sensações e, não podendo vivê-las, as guarda em cantos de papel e espaços descoloridos. Dentro de si fica, calada. E não há santo que possa tirá-la de lá. Há um moço, mas ele não consegue vê-la.

Tristes são os olhos desse moço, incapazes de enxergar um palmo à frente dos nomes e números. Tristes são os sentimentos dessa moça que, apesar da voz forte e sincera, perto dos olhos dele, permanecem mudos e calidamente amedrontados."

(Cleice Souza)
"Eu entendo você, mas não alivio. Está tão acostumada a mergulhar em seu sofrimento, que perdeu o lugar onde dói. Talvez o que doa esteja fora e você nem reparou."


(Fabrício Carpinejar)





"Seja qual fôr o caminho que eu escolher um poeta já passou por ele antes de mim"

S. Freud

quarta-feira, setembro 1




“A conversão do olhar:

de surpresa em surpresa,

essas minúsculas coisas

tão ausentes

tão remotas

tão gravadas

nas pupilas do vivido…“



{“António Forte Salvado”}










Água que tombas na superfície

Lisa dos meus olhos, és presença

De sempre, sabida na difícil

Viagem tão longa do silêncio…

E o teu contorno de aragem líquida

Desenha-se agora no meu sangue.



Fonte: origem clara da possível

Comunhão do amor com a distância!…



{António Forte Salvado}








“Pergunto-me desde quando

deixou de haver futuro

nas janelas.



Setembro  dói nos olhos

como areia

e tu e eu para sempre

sentados às escuras

no verão.“

{“Escuro – Rui Pires Cabral”}







«porque sei que me esqueces é que lembro

cada instante o que perco e não vem mais.»

 
{António Franco Alexandre}




nada entre nós tem o nome da pressa.

conhecemo-nos assim, devagar, o cuidado

traçou os seus próprios labirintos. sobre a pele

é sempre a primeira vez que os gestos acontecem. porém,



se se abrir uma porta para o verão, vemos as mesmas coisas –

o que fica para além da planície e da falésia; a ilha,

um rebanho, um barco à espera de partir, uma palavra

que nunca escreveremos. entre nós



o tempo desenha-se assim, devagar.

daríamos sempre pelo mais pequeno engano.



{Maria do Rosário Pedreira}





Yanni - Reflections of Passion




“O vento empurra-te para mim, transformado em

folhas caídas – escrita anónima do tempo.

É Outono. O pátio está já carregado de ti.

E o meu corpo recebe-te, enquanto viajo, ao som do

tango que estremece na escuridão dos teus olhos.“

{“Luísa Ribeiro”}


Encontrei o segredo, a chave de vidro

das palavras que escrevo; e tenho medo.

Talvez nos campos imensos, onde o lírio floresce,

na margem de rio que abriga, de manhã cedo,

os teus pés de ninfa, num engano de idade,

me tenhas visto à sombra de um rochedo;

e se os teus lábios, entreabertos num torpor

de romã, me tocaram num sonho bêbedo,

deles só lembro, imprecisos, fluxos

de incêndio numa hipótese de amor.



{Nuno Júdice}





"Sempre quis um amor cujo

BOM DIA!

morasse na eternidade de encadear os tempos:

passado presente futuro

coisa da mesma embocadura

sabor da mesma golada."



(Elisa Lucinda)



Tenho um amor fresco e com gosto de chuva e raios e urgências. Tenho um amor que me veio pronto, assim, água que caiu de repente, nuvem que não passa. Me escorrem desejos pelo rosto pelo corpo. Um amor susto. Um amor raio trovão fazendo barulho. Me bagunça. E chove em mim todos os dias."

domingo, agosto 29

Se Um Dia Me Quiseres - Zélia Duncan




O tempo, de vento em vento, desmanchou o penteado arrumadinho de várias certezas que eu tinha, e algumas vezes descabelou completamente a minha alma. Mesmo que isso tenha me assustado muito aqui e ali, no somatório de tudo, foi graça, alívio e abertura. A gente não precisa de certezas estáticas. A gente precisa é aprender a manha de saber se reinventar. De se tornar manhã novíssima depois de cada longa noite escura. De duvidar até acreditar com o coração isento das crenças alheias. A gente precisa é saber criar espaço, não importa o tamanho dos apertos. A gente precisa é de um olhar fresco, que não envelhece, apesar de tudo o que já viu. É de um amor que não enruga, apesar das memórias todas na pele da alma. A gente precisa é deixar de ser sobrevivente para, finalmente, viver. A gente precisa mesmo é aprender a ser feliz a partir do único lugar onde a felicidade pode começar, florir, esparramar seus ramos, compartilhar seus frutos..."




(Ana Jácomo)


"São saudades de um mundo contente feito céu estrelado. Feito flor abraçada por borboleta. Feito café da tarde com bolinho de chuva. Onde a gente se sente tranquilo como se descansasse num cafuné. Onde, em vez de nos orgulharmos por carregar tanto peso, a gente se orgulha por ser capaz de viver com mais leveza."

(Ana Jácomo)




"É uma benção inestimável receber amor. Mas quando a gente dói, precisa cuidar da própria dor com o carinho com que gostaríamos de ser cuidados pelos outros. Com a atenção e a suavidade com que tantas vezes cuidamos de outras vidas. Os beijos bons precisam começar em nós."


(Ana Jácomo)
 



"A paisagem onde a gente brincou pela primeira vez não sai mais da gente."



(Candido Portinari)